COMO UM DRAGÃO
Um dia eu volto a ter carro,
Mesmo que não o vá dirigir,
E eu quero ter ao meu lado,
O amor que me faz prosseguir.
Sei que já sou um velho carvalho,
Ou antigo baobá sem dar sombras,
Mas ainda me deito ao orvalho,
E me nutro de paz, não de bombas.
Eu abri mão dos velhos impérios,
E quero a civilidade que cuida,
Ou a voz ancestral com mistérios,
Porque tenho orixá que me ajuda.
Sou conecto com a mãe natureza,
Se quero fauna, flora e a terra,
Mas eu sei que a água é alteza,
Pois os rios brotam nas serras.
Já andei pelo meio das matas,
E bebi de córregos cristalinos,
Vi nas águas singelas baratas,
Tão azuis que deixou-me sorrindo.
Tive as botas sujas de lama,
E escorreguei em cada encosta,
Segurei em galhos de quarana,
Macerei folhas com as apostas.
Fiz pedidos e orei ao céus,
Como também me feri caindo,
Tropecei entre raízes ao léu,
E levantei meus pés de menino.
Voltarei a ser criança no fim,
Pois as pernas pedem muletas,
E as tipóias estarão bem ali,
Esperando que sejam aceitas.
Nesse final só restam os poemas,
Com a língua sibilando ao vento,
E o veneno de acentos e tremas,
Mesmo orando ao pai firmamento.
Serei estrela como meu dragão,
No caminhar que será sozinho,
Ruminando meus calos nas mãos,
E ninguém saberá meu caminho.