MORRE NA PRAIA
Ele nasceu para seus parceiros,
Mas teve que sair pelo mundo,
E, desde criança, foi coiteiro,
Do incesto de deuses vagabundos.
Se ele não se fizesse de Judas,
Nem mesmo poderia aqui vegetar,
Pois a vida são marcas de lutas,
Nas lúgubres grutas sem um luar.
Ele nasceu sem saber nem porquê,
E não teve tempo de se lamentar,
Pois miraram seu rosto de laquê,
E teve de correr sem sonhar.
Só com as cercas e com espinhos,
Ganhou escaras e todas as dores,
E viu noutro lado novos caminhos,
Mas logrou só viver os horrores.
Quando quis ter direito à vida,
Lhe disseram para ir ao inferno,
Mas Caronte nem mesmo o convida,
Pois lá se incinera sem o terno.
Antes disso lhe mandaram à guerra,
E viveu entre os bárbaros do mundo,
Ou até entre os povos sem terra,
Como em Gaza ou qualquer submundo.
Só viveu com os restos da carniça,
E lembrou quando estava no início,
Onde os reis eram bichos preguiça,
Ou demônios de um céu no hospício.
Foi então que pediu misericórdia,
Àquele em que muitos nem acreditam,
Pois a regra que pede a concórdia,
Também dá o direito aos que ditam.
E, assim, se jogou para os astros,
Se escondendo da maldade humana,
Desses bichos de burgos e castros,
Que não vão ter amor na cabana.
Viveu longe desse mar de lama,
Pois aqui quem fica é um pária,
Que só crê em ter ouro e fama,
Porque morre afogado na praia.