VIDA CONTÍNUA
Chega a tarde, mas é cedo,
Pois a tarde não finda nada,
Mas, é tarde se há o medo,
Quando a noite já não tarda.
Somos só um pulso luminoso,
Onde o brilho logo se apaga,
E só vamos ser vistos de novo,
Se nos tornarmos ervas da maga.
Em cada caldeirão que nos maceram,
Caberemos na bula que se formula,
No sentido das graças que queiram,
Ao apenas se satisfizermos a gula.
Mas a vida é contínua se cuido,
Pois é primordial ter sucessão,
E nos cobra andar sem descuido,
Senão se escorrega numa ilusão.
Ao cair alguém quebra ou machuca,
Ou encontra o portal que renova,
Só não vamos saber se foi culpa,
Se um corpo não recria na cova.
A nossa semente é tão diferente,
Pois não somos um caule fincado,
Mas pulamos e andamos pra frente,
Se pra trás sou um carro multado.
Não podemos ser lodo no fluxo,
E não devemos ser só tradição,
Pois o mundo gira em impulsos,
E não fica na mesma estação.
Há um dia para ver dinossauros,
Mas no outro é vulcão e geleiras,
Quando surgem os reis e vassalos,
E os servos vendidos nas feiras.
Esse humano quer ser dono de tudo,
Mas não sabe o que lhe faz viver,
E seu fim é numa festa ou de luto,
Pois há carmas do que veio fazer.