NAQUELES PORTAIS
O meu tempo é de mil tempestades,
Tão fechado que não vejo os raios,
Visceral, qual o gemido de Hades,
Neanderthal que me viu de soslaio.
Nesse tempo e naqueles portais,
Eu vivi entre monstros e lavas,
Com os vulcões em picos siderais,
Que cuspiam estrelas e galáxias.
Só não tinha esse humano do mal,
Pois os bichos só tinham a fome,
Ou apenas sede, que é tão normal,
Mas de honra e moral, nem o nome.
Tudo era bem simples nos corações,
A colher ou catar nosso alimento,
E saltar ou esgueirar entre anões,
Como a Branca de Neve e o vento.
Os cabelos cresciam sem amarrar,
E o soluço só vinha com os medos,
Pois os raios nos faziam sonhar,
No temor ante Zeus e seus dedos.
Tocar nas plumas de uma gaivota,
Celebrar o oceano com um albatroz,
Vai dizer que no mar não há bota,
Mas as escamas de um peixe feroz.
E foi assim que aprendi a pescar,
Sentadinho no alto do promontório,
Com meus fios da rede de ninar,
Pois deixei minha fé no oratório.
Mas ouvi o sino voltar a bater,
E falaram que viajei pelo tempo,
Pois hoje já não sei se vou ter,
Um tempo pra ter paz a contento.