SER APENAS A FERA
Eu queria ser apenas a fera,
Pra viver dos meus instintos,
Sendo o bicho que nunca espera,
Mas fala de um modo distinto.
Só que hoje o bicho é humano,
E a riqueza brota no hospício,
Pois ser rico é tão desumano,
Que se torna loucura e vício.
Tudo aqui nesse mundo é gratuito,
Pois ninguém compra essa vida,
Porque a gema não causa o luto,
Quando é o ovo que nos convida.
Se não fosse esse sol amarelo,
E o lugar à borda da Via Láctea,
Imagino que Thor e seu martelo,
Não teriam chance ou caráter.
Isso vale para todos os credos,
No edifício que moram as almas,
Pois só na perfeição do prédio,
A tormenta se aquieta na calma.
Nós devemos viver com os passos,
Sem dar pulos que nem as pulgas,
Como um carro na rota do espaço,
Que nos leva além das bermudas.
No meu clero quero orixás e anjos,
E uma mesa em que celebre a vida,
Porque nela é que sou mais humano,
Se houver água e chão na medida.
Mas se o céu não for nas estrelas,
Eu saberei que o inferno é delírio,
Pois fui caricato ao concebê-las,
Que a sobra é perdão ou martírio.