CULTURA E TERREIRO
Falar de cultura é falar da vida,
Vida que mostra jeitos de viver,
Então, eu digo o que me convida,
Se nessa vida cultura é viver.
Há quem confunda cultura e estudo,
Como se fossem coisas semelhantes,
Mas só ter olhos fechados em luto,
Não diz a nossa origem ou semente.
Meus ancestrais são minha cultura,
São o que fui, o que sou e serei,
Pois tudo é dado por essa mistura,
Da qual nós somos a fé ou a lei.
É nessa tocada que vi o terreiro,
Cultura que abraço dos imortais,
Os quais são os grãos do celeiro,
Que guardei entre os canaviais.
Somente assim me vem a senzala,
Em cada memória que desabrocha,
E fala dos dias sem mesa na sala,
Qual pintura rupestre na rocha.
Vivi para me livrar dos grilhões,
Buscando a mais fiel liberdade,
Não indo ao templo dos vendilhões,
Pois só no terreiro sou a verdade.
Ali eu discuto com a natureza,
Sou chuva e raios e vejo o rio,
Sou mar e mergulho nas profundezas,
Mas caço, guerreio ou sinto frio.
Também me revelo no colo de Oxum,
E colho uma concha para Yemanjá,
Procuro a forja e falo com Ogum,
Que, junto a Oxossi, vem me guiar.
É simples assim, mas tenho Xangô,
E até Exu fala de mim na encruza,
Mas vejo Logum nessa festa nagô,
Onde as cores de Dã são difusas.
Terreiro é por si um somatório,
Pois congrega as minhas etnias,
Desde quando assumi no cartório,
Os registros de todos os guias.