PEDIR OU AGRADECER
Fui treinado para só pedir,
Ou seria o pobre a mendigar,
Desde o dia que não dividi,
Como escravo há me lamentar.
Mil oitocentos e oitenta e oito,
Que ano foi aquele, de traições?
No qual enganaram-nos no coito,
Dizendo libertos os filhos do não.
Não fomos cidadãos, nem humanos,
Sem direito a uma casa ou escola,
Sem título de terra aos colonos,
Pois a preta cor só nos consola.
Consola saber que existe África,
E a sombra dos griôs é um baobá,
Que lá haviam reinos e cáfilas,
E saudávamos Oxalá com Epa Babá.
A escravidão perdura até agora,
Disfarçada de servidão pela cor,
Pois Doutor é o branco na ágora,
E ao preto resta ser gari de favor.
Aos pretos e índios só os restos,
Que as orgias de baco dispensam,
Mas na feijoada eu sou manifesto,
E sirvo a Ogum o que nem pensam.
Na essência do alimento há o axé,
E o orixá se agrada e responde,
Dando a força que nos põe de pé,
Como água é esperança na fonte.