PONTO ZERO AO ÚLTIMO DIA
Todo ano, desde um ponto zero,
Há meu início querendo ter fim,
E nem sempre serei o que quero,
Mas eu sei que existe o cupim.
Já andei por ruas e florestas,
Fui ao alto da copa dos jequitibás,
Onde estavam bichos em festas,
Com tucanos, harpias e carcarás.
Na baixada corriam os riachos,
E os peixes olhavam os biguás,
Tinha a paz de uvas em cachos,
E as ervas para cura e chás.
Adiante eu encontrei seriemas,
Despertando as chuvas de época,
Sem um avestruz, mas com emas,
Que passavam dizendo eureka,
Sempre caiam as frutas maduras,
Mas às vezes foi queda do coco,
E a cotia sabia roer coisa dura,
Esquecendo as sementes a gosto.
Foi assim que nasceu castanheiras,
Pra ter charme em plantar o caju,
E as sementes daqui vão às feiras,
Mesmo quando alimentam os tatus.
Se eu acordo diante do estábulo,
Sei que um ben-ti-vi está perto,
Ou está a comer sobre o gado,
Comensal, para ser mais correto.
No cercado em que deixo as cabras,
Eu também deixo os frutos do umbu,
Ou cada licuri com suas palhas,
Dos quais faço moquecas de pacu.
Quero acordar a cada novo ano,
Com a alegria de sorrir à bessa,
Pra poder não viver só jejuando,
A não ser que seja por promessa.
Vou querer o trinado das aves,
Muito mais que repente e viola,
Pra findar guerras e belonaves,
E só ter coisa boa ou escola.
Vou viver em eterno aprendizado,
Até que chegue o meu último dia,
E poder ensinar o que me foi dado,
Pois roubado não me traz alegria.