DEBAIXO DA ESCADA
Aquele castelo era insalubre,
Tendo um fosso junto à muralha,
E o esgoto escondido, me desculpe,
Era debaixo da escada que falha.
Alguém já caiu dessa escada,
Pois não pulou o degrau ausente,
Subiu sem olhar para a vala,
Onde o porco estava presente.
Debaixo da escada eu não passo,
Pois dizem que me dará azar,
E nem subo na escada descalço,
Pois um prego poderá me furar.
E meu sangue é somente salmoura,
Então não devo me ferir no altar,
Senão, serei imolado com a moura,
Que teimou ir à Ibéria morar.
Foi nos tempos de Torquemada,
E as guerras eram como orgias,
Com prazeres escusos da alma,
Que me fizeram voltar pra Bahia.
Eu não sei se tinham descoberto,
Pois aqui já morava o meu povo,
Mas eu fiz questão do mar aberto,
Que me leva a meu cerne de novo.
Sou mais índio e preto que branco,
Pois a cor brasileira é com o sol,
Em caatingas ou Canudos do Santo,
Que sofreram ser ver um girassol.
Só me lembro dessas peripécias,
Que fizeram de mim um menestrel,
A cantar e falar controvérsias,
Pois eu sempre serei o tabaréu.
Ter medo de qualquer gato preto,
Ou medo de passar debaixo da escada,
São pilhérias contadas num gueto,
Pra dizer ao inimigo que é nada.