SOMOS ALGOZES
Eu nunca esperei por fatalidades,
Mas sei que viriam enquanto durmo,
Com estrela cadente sobre a cidade,
Enquanto há coruja em voo noturno.
Eu sempre afrontei as verdades,
Pois elas vivem da fé e do luto,
Ou enganam até mesmo a saudade,
E acreditam que eu seja maluco.
A sorte do homem é ser um tempero,
E o azar do mundo é ter receitado,
Porque o respeito se deve primeiro,
E quando discordo me sinto coitado.
O mundo existe bem antes do homem,
Que chega enganando a dor e a peste,
O mundo é o vampiro que consome,
Se até o vinho é sangue do mestre.
O mundo tem fome e isso é demais,
Mas fome com a paz é mais barato,
Se o trigo não nasce nos quintais,
Ao ser livre dos capitães do mato.
É como um gato sem achar o leão,
Que vive o mister de pegar ratos,
Mas se o mar só clamar por tufão,
Vou até Poseidon pedir o distrato.
Há guerra nesse mundo de algozes,
Pois vida e morte são dos ofícios,
E se pensamos que sejam ferozes,
São os dias de selva ou de vícios.
Queremos tudo o que já é nosso,
Mas não entendemos nosso querer,
E o que é preciso não é negócio,
Pois negociamos o ter e não ser.
Só por isso as feridas não curam,
Onde o pus não estanca a sangria,
E os censores da lei me procuram,
Pois, eu preso, lhes darei alegria.