NESSA MARGEM
Não tenho as lágrimas de todos,
Nem a mesma dor dos que sofrem,
Talvez apenas querendo consolo,
Como as rimas de cada estrofe.
O mundo padece enquanto agoniza,
E o pobre tem a espada no peito,
Se não temos quem nos rivaliza,
Mas criamos um futuro imperfeito.
Vivemos a criar nossa realidade,
Mas será que ela existe mesmo?
E teremos na Matrix a saudade,
Ou seremos um milagre no ermo.
Nessa margem de céu ou galáxia,
Ninguém vai ser contínuo e eterno,
A não ser quem não diz o que acha,
Porque é sem escrever no caderno.
Quem escreve, pinta ou edifica,
Talvez ache que define o futuro,
Mas quem é, simplesmente palpita,
Ante o caos, na luz ou no escuro.
Quando se é jovem, tudo é futrica,
Mas queremos ter amigos e brincar,
Sem pensar num futuro de intrigas,
Que os adultos não vão dispensar.
Mas se não tenho o sol ou luar,
E a tempestade vem com coriscos,
Tudo é triste se não há um lar,
Nem o céu e o arco-iris avisto.
Talvez eu esteja na voz de Platão,
Vendo sombras em uma fria caverna,
E, por isso, sonho sem ter noção,
Como sombras em meio à caterva.
Quem quiser um grão de realidade,
Deverá saber que o dia é presente,
E viver o futuro da ancestralidade,
Só sabendo ser uma boa semente.
E assim, cada lágrima que surge,
Poderá ser fruto de nossa alegria,
Pois as dores ensinam o que urge,
Quando a fome é o infarto do dia.