COISAS DE ANTES
Está muito frio, meu Senhor!
E não tenho mais seu agasalho,
Tô jogado aos leões e sou dor,
Bem além do que fui espantalho.
Vejo a lua por trás do condor,
Sem a causa dos vôos noturnos,
Onde achei as corujas em amor,
Pois, à noite, é tudo difuso.
Selo a mula, mas ela refuga,
Talvez por causa da jararaca,
Boto então meu chapéu na nuca,
Protegendo o ori de uma jaca.
Tem quem diga que a maçã cai,
E que Newton aprendeu com ela,
Mas se é o sangue que esvai,
É porque a faca não é cega.
Há sinistros de faca e de bala,
E neles nos sujamos de sangue,
Só que um foi quando cozinhava,
E outro foi no lodo do mangue.
Cortam o dedo descascando laranja,
Mas não querem ajudar na cozinha,
São esses homens diante da canja,
A dizer que não matam a galinha.
Em meados do século passado,
Quase todos moravam no campo,
Mas o mundo hoje é avançado,
E no meu saudosismo nem planto.
Quem viveu como os ancestrais,
Sabe o quanto foi dura a vida,
Mas agora não há mais samurais,
E as guerras não têm medidas.
As armas agora viraram notícia,
Como fossem os símbolos da paz,
Mas esquecem que não é carícia,
O terror que nos torna incapaz.
Hoje há só genocídio e loucura,
E o povo quer tudo sem o preço,
Querem ter sem trabalho ou cura,
Pois estão doentes desde o berço.
Tudo é fertilizante e hormônio,
Onde engordam boi, porco e galo,
E se juntam sem ter matrimônio,
Onde o sino já vem sem badalo.
Eu queria as coisas de antes,
Mas trazendo a cura às doenças,
Se perdi Castro Alves ou Dante,
E a loucura me traz desavenças.