CASA VELHA, MAR E CHUVA
A casa do campo era velha,
E tinha mil plantas ao lado,
Mas o teto ainda é de telha,
Da olaria que vi no serrado.
Eram boas telhas de Caetité,
Que comprei quando fui à Lapa,
Mas o pedreiro de meia colher,
Cobriu a casa em três etapas.
Fez primeiro a cozinha e sala,
Pra depois ir cobrir os quartos,
E, ao fim, vi chuva e ressaca,
Enquanto pintava meus quadros.
Perto da casa eu fiz o galpão,
Onde eu guardava as ferramentas,
Da enxada, ancinho e o facão,
Ao martelo e a chave de fenda.
E ao lado oposto está o barracão,
Para orar e louvar quem me guarda,
Pois na vida não basta o pulmão,
Mas ter fé nos anjos da guarda.
Deus me tem desde antes de tudo,
Muito antes de a Terra ser lar,
Mas nas rezas é onde eu escuto,
Cada sussurro do vento e do mar.
Não preciso ir a lugar algum,
Pois eu sou essência da terra,
Donde sinto a presença de Ogum,
E os caminhos de paz e guerra.
Lá se foi o velho tempo feroz,
E agora eu só quero ter paz,
Só planando como um albatroz,
Para olhar tudo que "Ele" faz.
Tenho medo do profundo do mar,
Mas eu sei que de lá nascemos,
Pois não haveria vida nem lar,
Só havendo o sol sem o sereno.
Mas a maré não vem só banhar,
Minha praia e o meu sedimento,
Pois que a chuva evapora do mar,
E traz pra caatinga um alento.
É por isso que há dança da chuva,
Como os cantos que evocam o rio,
Porque não terei vinho sem uva,
E nem seu aconchego sem o frio.