O QUE AINDA EXISTE
Embora o cheiro seja de festa,
E o clima de verão nos convide,
Já não tenho espinhas na testa,
Mas gosto de ver quem duvide.
Enquanto há salitre indomável,
E a brasa assa queijos coalho,
Eu, cá, no meu canto inefável,
Antevejo o quanto é que valho.
Eu, jovem, me achava eterno,
Mas nem tudo ainda eu sabia,
Senão for o que li nos cadernos,
E alfarrábios sem ter garantia.
E o tempo aos poucos me mostra,
Tudo que poderia ser realidade,
Mas são máfias como Cosa Nostra,
Que nos dita preço e liberdade.
Se não posso me ver liberto,
Penso como tá o resto do mundo,
Sendo barco que vê o mar aberto,
Tendo medo do quão seja fundo.
Até quando estarei nessa guerra,
E pergunto se nela me encaixo,
Porque águas não sobem serras,
Se não for para verter abaixo.
O que ainda existe ou resiste,
Têm motivos nem tão evidentes,
Se o tempo é tudo que insiste,
Num impulso de ser diferente.