POSTO À PROVA
Nascido em plena ditadura,
De um ventre duro na queda,
Sem mamar a teta mais pura,
Se o doutor a tudo renega.
Mas eu grito e durmo adiante,
Já sem forças para deleitar,
Por ser prematuro ou infante,
De um tempo com medo de amar.
Não houve seio e incubadora,
Para quem chegou com pressa,
Bem antes do fim da lavoura,
Sem ter direito a conversa.
Queda, tranco e muita espera,
Fez a piscina verter sua água,
Mas no dia que nos desespera,
Só mainha entende as mágoas.
Mágoa do doutor que não agia,
Choro por não tomar o banho,
Na caixa de algodão que havia,
Sendo berço devido ao tamanho.
O corpo menor que dois quilos,
Imaginem isso em carne e ossos,
Num tempo com seus andarilhos,
Mas todos rezavam o Pai Nosso.
Parecia que Cronos me engolia,
Logo vi nas cartas do baralho,
Por reinar como grande harpia,
Mas eu dava mesmo é trabalho.
Pobre eu era e ainda eu sou,
Sem dinheiro, ouro ou emprego,
Mas a sina é de ser vencedor,
Como o ancestral que não nego.
Sou fruto que quase não vinga,
Sou mistério do próprio existir,
Vim aqui vencendo a mandinga,
Sou quem veio sem medo de vir.
Fui posto à prova em corrente,
Mas só devo favor a quem gira,
Sendo neto de quem é presente,
Com Ogum e também Gongobira.
Sou de Antônio, José e João,
Pois Jesus me falou em Belém,
Venha só bendizer nesse chão,
Que o tempo será só do bem.