MEU EU VELHO
Depois de viver na labuta,
Meu eu velho só quer alforria,
Com pão e mingau de araruta,
E seu direito de ter alegria.
Ele merece atenção todo dia,
Como a gratidão da sua prole,
Pois viveu sendo pai e guia,
A prover do que rega e colhe.
Ele deixa o exemplo e vivência,
Mesmo quando houveram percalços,
E também quer a nossa paciência,
Pela agonia de ter sobressaltos.
Suas pernas e mãos tanto tremem,
E a coluna enverga com o tempo,
Não lembra dos músicos de Bremen,
Nem do saci girando ao vento.
Não bebe mais o fermento da cana,
Nem degusta do malte estrangeiro,
Comida lhe dão na beira da cama,
E não vai sozinho ao banheiro.
Somente lhe resta prever o além,
Porque todos lhe acham senil,
Pois não sobe em buzu ou trem,
Mas viaja em primeiro de abril.
Quem não quer o arisco pecado,
Sai bem antes do fim da festa,
Só que a vida é Deus exaltado,
E o mistério que se manifesta.