JOGADOS AO VENTO
Não vejo um motivo sem dor,
Desde que seja do sobreviver,
Pois a dor não precisa favor,
Nem nos é fácil de esquecer.
Mas não vale punir as idéias,
Pois idéias só doem nos donos,
Desde que tu creias ou odeias,
Tão somente como um desabono.
Quem discorda de ti é normal,
Pois o mundo é dual e diverso,
Desde quando há cultura geral,
E difere se calo ou converso.
Se uma história mudar no ouvido,
Quando falam de modo repetitivo,
Terá volta noutro jogo vivido,
Ou infla o seu sexto sentido.
E, por isso, preciso filtrar,
Toda fala que chega furtiva,
Pois terá quem queira enganar,
Ou ganhar a disputa vendida.
Já dissera Jesus a alguém:
Vai, a tua fé te salvou!
E agora ou mesmo em Belém,
Com a fé sobre a água andou.
Quem entende a alma humana?
Quem dirá o depois da partida?
Como deve ser paga a banana,
Que o homem comeu pela vida?
Se o homem comeu por ter fome,
Ou somente para sobreviver,
Não se pode gostar de ter fome,
Que não pôde sequer escolher.
Hoje somos jogados ao vento,
Que flameja nossas angústias,
E a coceira de um cão sarnento,
Simbolizam as nossas agruras.
Já pensei na sina de Cristo,
No aguardo das dores na cruz,
Mas não sei porque eu insisto,
Ou existo sem nem um cuscuz.
O que vejo é somente deserto,
Sem oásis que possa acolher,
Pois o ódio do homem é incerto,
Se o amor ele insiste esquecer.
Só me falta um último sopro,
Mas aguardo o perdão de Deus,
Vou relendo as fábulas de Esopo,
Como as uvas do único adeus.