NA SEXTA DE PEIXE
Toda sexta-feira é dia de peixe,
O que não impede a carne bovina,
Mas tudo é tão caro como o azeite,
Que nem posso o filé da corvina.
Bom mesmo seria o robalo ou badejo,
Pois cá no sertão só se vê a traíra,
E suas espinhas é tudo o que vejo,
Mas, se as engulo, não sei a saída.
Me resta o consolo de ter cabrito,
Pastando no mato por onde eu ando,
Lá colho o leite, que dá um litro,
Se a cabra é um bicho sem comando.
Eu busco a água que molha a terra,
Porque no sertão a chuva é pouca,
E o vento espalha por cima da serra,
Deixando a caatinga numa febre louca.
A chuva que vinha de lá do oceano,
Passou por Campina e achou Maranhão,
Deixando a roça sem chuva no ano,
E a mãe nordestina de pires na mão.
Modificaram o deserto em Negueve,
Lá hoje plantam e se pode morar,
E cá, sem açude, nada me serve,
Mas o Velho Chico podemos salvar.
Cobrindo os cílios do rio e açudes,
Mantendo os bichos de cada lugar,
E com umbu, que de bom, é tão rude,
Vamos ter o milho pra o mungunzá.
A noite sertaneja é cheia de luz,
Que vem das estrelas ou de um luar,
E cada chocalho que a cobra conduz,
Me diz o caminho por onde passar.
Aqui na caatinga, tem povo feliz,
Até se a igreja for légua de andar,
Pois reza é consolo e um chafariz,
Que rega a sede, com fé ao orar.
Acordar ao som que vem do poleiro,
Tirar o leitinho que vamos tomar,
Chupar melancia que dá em janeiro,
Comer macaxeira e bolo de fubá.
São coisas que nosso sertão propicia,
No coro dos sapos do brejo que há,
Pois toda manhã sabiá me anuncia,
Que o dia é longo se cedo acordar.