O BRASIL DOS CAFONAS
O BRASIL DOS CAFONAS
Convivemos num Brasil que parou no tempo, seduzido pela nostalgia de um passado tão cafona, desalinhado com os perfis da revolução francesa, por suas propostas filosóficas.
Vivenciamos todo tipo de horror no passado, mas padecemos da inexistência de uma história plenamente registrada, por não termos mesmo essa tradição, já que os portugueses de outrora eram mais afeitos ao registro historiográfico dos fatos ligados à corte real e ao recanto ibérico, sem ter o mesmo zelo com suas colônias.
E o caso brasileiro é mais emblemático, pois decorre de um espaço geográfico atentado por todo tipo de violações, pois foi alvo da pirataria mundial, quanto ao tráfico de suas riquezas naturais, desde antes da colonização oficial, que se perpetuou pelas invasões francesas, holandesas e o domínio monárquico espanhol, que durou cerca de oito décadas.
Mas não podemos também esquecer que as demais civilizações, principalmente as que foram escravizadas ou exterminadas, nem sempre tinham suas tradições e histórias transmitidas por registros escritos, mas sim de modo oral ou pela prática diária de seus ritos e costumes.
É por isso que hoje, nesses tempos contemporâneos, há a sensação de termos um passado idílico e glamouroso, quando a realidade embasada na pesquisa antropológica, arqueológica, eventualmente bibliográfica, e nos demais métodos de estudos da nossa sociedade, nos sugerem dizer que nada sabemos sobre o "modus operandi" da classe dirigente e todo seu compadrio.
Aos olhos da grande massa social, tudo antes era belo, sadio, correto, ético e moral, imputando à sociedade antiga um retrato que padece de realidade e veracidade, já que tudo é especulativo, se baseando apenas no que se ouviu falar.
E assim é que pintamos um quadro de beleza e ações míticas sobre os acontecimentos de outrora, pintando telas em que as mulas sujas, e pessoas toscas e imundas, se transformam, pela ação dos artistas, em garbosos cavalos e seus cavaleiros ilustres e bem vestidos, nos incutindo a idéia de nobreza no passado, onde não haveriam malfeitores, ladrões, corruptos, torturadores, tiranos, psicopatas e fratricidas.
Todavia, é no hoje que deveríamos nos ater para buscar uma apurada reflexão do que somos, pois se "ontem" não podíamos filmar uma atitude ou ação ilícita, um crime ou um ultraje, uma traição ou uma mentira, no "presente" o que dispomos é tecnologicamente escarnecedor, demonstrando com imediatez qualquer ação, inclusive com a capacidade de rever atos praticados ou até os pensamentos e desejos urdidos na calada das noites sombrias.
Hoje não se pode esconder quase nada, mesmo perante a mais ingênua das pessoas, pois temos recursos mil de como desmascarar um salafrário, um déspota ou um criminoso.
Somente fico estremecido é com o potencial funesto que tem mostrado todo tipo de cafona destes dias midiáticos e cibernéticos, os quais nunca estudaram nada ou, se o fizeram, foi para se prepararem para o continuísmo do papel representado pelos ladinos e sagazes de outrora, que ainda têm raízes entranhadas no terreno social do nosso triste "terceiro mundo", se é que podemos assim dizer, já que nem todos estão preparados para se confrontar com o divino e o destino, pois as cruzes e balanças estão logo ali na frente, sem nem mesmo enxergarmos, vez que são como uma cumbuca, onde colocamos nossas mãos, mal sabendo que lá dentro tudo podemos encontrar, até mesmo o nada.
E vamos cimentando os quintais, que já nem existem mais, pois juntamos nossas construções, muito embora nos sintamos cada vez mais distantes uns dos outros, e selamos nossos caminhos, seja com paralelepípedos ou asfalto, lacrando todos os poros, sem deixar nossa mãe terra transpirar ou saciar a sua sede.
Vamos cantando hinos e não poemas de amores, ridicularizando tudo e todos, com chacotas e piadas de mau gosto, com chavões ou bordões chucros e indigestos, a nos digladiar sem nem mesmo sermos espartanos ou bárbaros avançando sobre Roma, como Aníbal ou até Átila demonstraram serem capazes.
Continuamos a nossa cruzada, chibatando quem nos cerca, torturando nossos mártires, desprezando o que é fato, mas decantando mil mentiras, pois os contos repetidos todo dia e toda hora, viram verdade absoluta para um leigo e miserável, que se sujeita à hipocrisia e à força com que os vampiros se lançam sobre as jugulares de um servo ou um humilde, pois que esses se prostram ao martírio, convencidos até de que essa seja a vontade de Deus, se deixando esquartejar ou serem empalados e queimados nas fogueiras, como o fora a heroína Joana D'Arc, pois o povo inglês, ao fim da carnificina, se achava correto e santificado, mesmo diante do fedor da carne assada, pois teriam feito o que suas toscas e desumanas consciências lhes mandaram, sem se perceberem doutrinados e hipnotizados pelas bestas do poder e do apocalipse social.
Publicada no Facebook em 06/09/2019