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Prosas de Braga
Vivências e sonhos de um poeta e eterno aprendiz!
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UMBUZEIRO, BARRIGUDA E BAOBÁ: VIDA QUE TEIMA NAS ADVERSIDADES DO SERTÃO
UMBUZEIRO, BARRIGUDA E BAOBÁ: VIDA QUE TEIMA NAS ADVERSIDADES DO SERTÃO

Quando adentramos na caatinga nordestina, encontramos dois espécimes vegetais distintos, mas que são como todo vegetal de áreas tendentes à desertificação, exemplos exóticos de vida e sobrevivência, pois desafiam as adversidades, como se isso fosse uma prova de resistência, de coragem e de teimosia, diante do quase nada que lhes é ofertado para existir.

Eles estão a demonstrar que o nosso planeta é pródigo em vida, mesmo onde achamos tolamente que nada pode existir, como é o caso do umbuzeiro, que é árvore endêmica de certos espaços do sertão nordestino, com suas raízes que retêm água e nutrientes através de grandes batatas, mantendo a planta em uma semi hibernação, como forma de sobreviver aos longos períodos de estiagem ou como expressão de vida que teima nas adversidades do sertão.

O umbuzeiro se deixa perder todas as suas folhas, ficando como se estivesse morto, seco e pálido. Mas, basta o ciclo curto de chuvas voltar que ele se revigora, reinicia a sua inflorescência e a sua posterior folheação para enfim bilrar os frutos que alimentaram as famílias de catingueiros, suas criações de animais caprinos, ovinos, muares, bovinos e equinos, seus cães e gatos, galinhas, perus e patos, sem falar em todas as espécimes selvagens ou domesticáveis que existem nesse habitat característico e lúdico, que é o sertão brasileiro e baiano em particular, onde ainda sobrevive a jaguatirica, a suçuarana, o lobo guará, o sariguê, o gambá, o caititu e a seriema. São aves de tantos tipos, como zabelê, sabiá laranjeira, sabiá bico-de-osso, pássaro preto, anum, jacutinga, bem-te-vi, assanhaço, canários da terra, rolinhas calda-de-feijão e fogo-pagô, pombas de arribação, carcarás, urubu-de-cabeça-vermelha, periquitos, cuiubas e papagaios, os quais se nutrem e revoam entre as árvores e arbustos retorcidos pelo clima agressivo que lhes dá colo.

É impressionante como o umbuzeiro é arredio, quase não se reproduzindo de modo artificial, por enxertias, mas com certeza ele reina, juntamente com o juá, a gameleira, a imburana, o pau-ferro, a aroeira, o cajueiro e tantos outras essências florestais e florais, que fazem do sertão um espetáculo das abelhas silvestres e sem ferrão, como as jitaí, jandaíra, uruçu e mandaçaia, ou do besouro mangangá, todos esses exemplares são polinizadores majestosos, juntamente com os colibris.

O interessante é também perceber a grande interação que as criações de caprinos e bovinos têm com o umbuzeiro, pois podemos perceber que ele não só alimenta, mas sombreia os locais de descansos destes animais, sendo que os caprinos gostam tanto dos frutos que até trepam em seus galhos, como se aves o fossem.

Mas é também exótica a presença da barriguda, que é parente do baobá africano, a qual tem a forma de uma gestante no seu tronco, mas com seus parcos ganhos parecendo raízes e com poucas folhas, mas que tem propriedades medicinais que sempre foram usadas pelos catingueiros e indígenas.

Assim como a barriguda em seu formato de tronco grosso e jeito peculiar de sua copa, o baobá, lembram as lendas africanas, reclamava de Deus por achar os outros espécimes vegetais todos muito mais belezura, e que, como castigo por tanto se lamuriar, foi arrancado do solo e colocado de cabeça para baixo, passando a ter as suas raízes a decorar a sua copa.

Mas o baobá, com seu tanque natural de armazenamento d'água, que pode chegar a 120 mil litros, ou a barriguda, com seu tronco inchado, como se fosse a mãe perto de parir, na realidade são e exemplos de vida e suporte para sobrevivência de variados espécimes animais, como as plantas xerófilas, com seus exemplares nordestinos nos xique-xiques, cactos e mandacarus, onde esses últimos têm sua importância ressaltada nos versos decantados por Luiz Gonzaga, onde quando ele "fulora lá na seca, é o sinal que a chuva chega no sertão!".

Do mesmo jeito, "o sertanejo é, antes de tudo, um forte!", como disse muito bem Euclydes da Cunha, no celebre Os Sertões. Seu rosto, enrugado pelos dias de sol a sol, curtido e recurvado como se ao mesmo tempo fosse um quasímodo, mas como ressaltou maravilhosamente o mesmo Euclydes, com a força de um Héracles. Isso o faz ter a resistência do umbuzeiro, guardando as poucas gotas das raras chuvas, ou cavando os açudes e cercando os leitos secos dos riachos temporários que rasgam o solo castigado pelo tempo e pela barreira natural da mata atlântica ou da serra da Borborema, aliado aos fenômenos climáticos decorrentes das influências dos oceanos pacífico e atlântico, sem falar da própria floresta amazônica.

Mas falar do catingueiro, esse sertanejo hercúleo, é lembrar de preciosidades como o queijo coalho de cabra, o bolo de macaxeira, a farinha de mandioca, a abobora e a melancia, sem falar na manteiga de garrafa a temperar a carne do sol e a carne de charque, que essa última aqui é mais decantada como carne de sertão.

Decantar o catingueiro é também pensar se deleitando sob as estrelas de uma noite de lua nova, com céu límpido de brigadeiro, com o cobertor em espiral da Via Láctea a nos acalentar. Ou contando causos e repentes, tocados nas violas sob a lua cheia de São Jorge, ouvindo o piar das cobras e corujas, já que sobram cascavéis, jararacas e cobras corais a ciscar os solos pedregosos e arenosos que se enchem de quixabeiras e juremas.

Admirar o catingueiro é saber que as suas madrugadas são o prenúncio do alvorecer, que sob o cantar do galo às quatro da manhã, nos traz a esperança renovada pelos primeiros raios do sol a fechar do ciclo da lua, num momento que a percebemos se esvair sob o clarão majestoso que se aproxima, nos energizando para a ordenha matutina enquanto botamos a chaleira sobre a chapa dos nossos fogões.

Tomar um café passado no fogo à lenha, no amanhecer ou sob a luz de candeeiros ou candeias, percebendo o teto baixo das cozinhas enfumaçadas, mas aconchegantes, que foi pilado às vezes com cravo e até canela, dando um sabor característico de um café de roça, acompanhado por um bolo de puba, biscoitos João duro, requeijão bem curado, bem escuro e cheiros de rachaduras de onde escorre a manteiga em breves gotas.

Estar também acompanhado da família, dos vizinhos e compadres nesses momentos de reflexões e até de orações por uma vida sofrida, dia a dia, com a esperança dos dias de chuva redentora, que traz as garças para a beira dos açudes, que se enchem de traíras, cascudos e camboatás, é um regalo para poucos nesse mundo.

Apesar do decantado sofrer de quem vive na caatinga, o que lembro com saudades, seja da infância ou até da maturidade, é que lá o por do sol é mais bonito do que nos outros lugares. O valor que se dá ao pouco que se tem, degustando tudo com apuro, guardando a água com zelo, nas cacimbas, nas talhas e cisternas, nos faz mais esperançosos na vida, do que nos lugares em que tudo é fácil.

Bordando os telhados das casas com calhas para não desperdiçar a rara água dos céus, nos prevenimos para as ocasiões boas e ruins, com a certeza de que venceremos sempre, para apreciar a vida que segue, serena e cadente, como o ninar de uma criança, que se aconchega no colo e no peito da mãe, se fartando de carinho e amor desmedido, em todos os sentidos, sem pressa desregrada dos grandes centros urbanos, percebendo cada momento vivido, com grande contemplação, já que a nossa hora só pode ser marcada pelo relógio divino e não pelo desatino dos que querem mais do que o necessário.

Desse modo, eu desdenho dos que vivem para ter o que não vão nem ver, sentir ou usufruir, ou mesmo saber para que tanto acumulou e guardou, para somente o tempo carcomer e enferrujar. É como se quiséssemos todo o ouro dos faraós para adornar seus sarcófagos e tumbas, que não levaremos juntos para o destino etéreo e espiritual que tanto esperamos e que, para nós, é tão breve, que nem se parece com a espera dos baobás, que vêm a colheita das tâmaras que foram plantadas pelos que não as puderam colher. Ou é até como o vento, que molda as montanhas e as rochas, não dando a chance a nenhum de nós mesmos lhe perceber o agir, como se cegos fossemos fúteis ou tolos, que não imaginamos o que a natureza é capaz e nos usa apenas, se não soubermos realmente apreciar o presente da vida que estamos a experienciar, para nos preparar o mergulho no grande oceano do mistério divino.

Seria maravilhoso se nós crescêssemos como os estalactites, lentamente mas num crescente imemorial, nos ligando ao solo para só assim terminar. Se pudéssemos vislumbrar a história com o segredo do mel bem guardado ou conservados, como na fábula de Cinderela, acordando tão bela, sem se desgastar.

Mas o tempo é senhor dos destinos, e só ele é capaz de mostrar o poder do Criador de tudo que existe e que persiste em se recriar, pela eterna energia que transborda no Universo, nos mistérios das estrelas e dimensões que se escondem no infinito, e que sob a sombra de um umbuzeiro, ou no doce sono, embalado numa rede pendurada pelas cordas de um agave, de janeiro a janeiro, estaremos a sonhar.

Até o momento final de cada um de nós, que o sertão permita que a vaquinha e a cabra deem o leite, a carne e o couro, que será curtido para o gibão do vaqueiro, que no lombo do seu cavalo ou do jerico irá campear, tocando o gado, plantando o milho de José, Antônio, João e Pedro, que santificam seus dias, junto com Jesus e a Virgem Santíssima, o qual comeremos assado ou nas canjicas, mugunzá e nos bolos, nos dando consolo pra vida louvar.
Poeta Braga Costa
Enviado por Poeta Braga Costa em 04/04/2020
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