PRÓPRIO NA COR
Próprio na cor pelos fótons,
Me tornei melanina e suor,
E a roupa na qual me conforto,
É vestida na Ásia Menor.
Relendo o odor dos sovacos,
Descobri que ninguém é melhor,
Pois branco ou preto no trato,
Somente refletem meu Sol.
Meu cheiro não é um retrato,
Mas somos a estrela maior,
Porque conhecemos de fato,
Que a força tortura sem dó.
E assim, nós pagamos por tudo,
Mas sempre é preciso acordar,
E ver que há irmãos no escuro,
Pois noite foi feita pra amar.
Por isso eu derrubo a senzala,
E cobro o resgate das vidas,
Pra dar liberdade a quem fala,
Que escravidão são feridas.
Será tão preciso as misérias,
Que a 'Praga do Egito' nos traz?
Pois levam a cor da matéria,
Mas valor é o viver pela paz.
E o preto perdura em reclames,
Pra ter casa, escola e comida,
Mas pelo direito que chame,
Seu povo que cobra acolhida.
Viver nas sequelas do tráfico,
E escravo da dor que não sai,
É algo que não será pago,
Mas deve servir de bonsai.
E assim, cultivando o arbusto,
Veremos porque somos gente,
Pois mesmo vivendo de susto,
A cor deturpada é clemente.
Pois preta é a ama de leite,
Que sofre mas cuida da gente,
Enquanto o chicote é deleite,
De um sinhozinho doente.
E a dura versão da maldade,
Em ferro de brasa é marcada,
Servindo a quem tem vaidade,
E aos donos da vida roubada.
Roubada da terra e do sonho,
Kalunga é água sem o pão,
E após ver navios tristonhos,
Queremos direito ao chão.
Queremos também liberdade,
Vivendo com plena virtude,
Gozando até pelas tardes,
O deleite de ter atitude.